Meu casamento com mamãe
Foto: Gustavo Razzera
Para minha mãe
Para mim, a peça começa com o nascimento. Não o nascimento da filha, mas o nascimento da mãe. A mãe nasce quando nasce o filho, ou renasce quando nasce o irmão. O parto é de dois. E nisso nasceu também a minha vontade de agradecer a minha mãe.
Nasci na noite de um entardecer quente de janeiro, numa terça-feira em que minha mãe barriguda trabalhou o dia inteiro. Ela servia cafezinho, durante a semana, numa joalheria chique de São Paulo e era camareira de teatro quando tinha folga. Como comigo, a vida a levou para a copa e para o camarim, ao invés do balcão e do palco. E, a cada dia em que eu me torno a realização pessoal da minha mãe, fico com a pulga atrás da orelha sobre “e ela? Ela é a realização pessoal de si mesmo?”. Meu casamento com mamãe se dá nessa esfera de relacionamento entre eu e aquela que me deu a vida, sem abdicar de ter uma vida.
Sem abdicar de ter uma vida: a própria vida.
As situações criadas pelo casal de diretores Fernanda Marques e Eduardo Mendonça nem sempre andam onde eles devem ter querido. Proporcionando uma narrativa contada de forma nada linear, em que as falas são tão plásticas quanto as cadeiras, em que as palavras são tão visuais como também a trilha sonora, a liberdade está na teoria.
Minha mãe nunca me proibiu de nada. Os chocolates sempre estiveram ao meu alcance a qualquer hora do dia. E lembro de poder ficar na rua até a hora que eu quisesse desde que essa hora fosse previamente avisada e posteriormente cumprida. No entanto, não lembro de acordar com um copo de toddy ao lado da cama, nem histórias lidas ao dormir ou conselhos ao filho adolescente. Os atores de “Meu casamento com mamãe”, envoltos e envolventes em situações nada coerentes enquanto parte, mas bastante coesas como um todo, são formais demais. Marques e Mendonça não são pais tão liberais quanto parecem ser. Cada movimento, principalmente em Yheuriet Kalil e Luisa Herter, exibe uma marca que talvez devesse ficar submersa. Dos olhos a ponta do pé, de um modo geral, o espetáculo exibe uma insegurança própria de filhos cujas mães não são experientes ou são rígidas demais. Acrescenta-se a isso a triste situação do Teatro Hebraica, sucateado por sua mantenedora. Um palco com piso de parquet não favorece ninguém que não a tia da limpeza. O mesmo se dá na relação calças e iluminação. As calças de Kalil e de Rafael Régoli refletem a luz, essa já bastante pobre em termos técnicos, embora com visível boa vontade naquilo que diz respeito à estética.
Para mim, a peça começa com o nascimento. Não o nascimento da filha, mas o nascimento da mãe. A mãe nasce quando nasce o filho, ou renasce quando nasce o irmão. O parto é de dois. E nisso nasceu também a minha vontade de agradecer a minha mãe.
Nasci na noite de um entardecer quente de janeiro, numa terça-feira em que minha mãe barriguda trabalhou o dia inteiro. Ela servia cafezinho, durante a semana, numa joalheria chique de São Paulo e era camareira de teatro quando tinha folga. Como comigo, a vida a levou para a copa e para o camarim, ao invés do balcão e do palco. E, a cada dia em que eu me torno a realização pessoal da minha mãe, fico com a pulga atrás da orelha sobre “e ela? Ela é a realização pessoal de si mesmo?”. Meu casamento com mamãe se dá nessa esfera de relacionamento entre eu e aquela que me deu a vida, sem abdicar de ter uma vida.
Sem abdicar de ter uma vida: a própria vida.
As situações criadas pelo casal de diretores Fernanda Marques e Eduardo Mendonça nem sempre andam onde eles devem ter querido. Proporcionando uma narrativa contada de forma nada linear, em que as falas são tão plásticas quanto as cadeiras, em que as palavras são tão visuais como também a trilha sonora, a liberdade está na teoria.
Minha mãe nunca me proibiu de nada. Os chocolates sempre estiveram ao meu alcance a qualquer hora do dia. E lembro de poder ficar na rua até a hora que eu quisesse desde que essa hora fosse previamente avisada e posteriormente cumprida. No entanto, não lembro de acordar com um copo de toddy ao lado da cama, nem histórias lidas ao dormir ou conselhos ao filho adolescente. Os atores de “Meu casamento com mamãe”, envoltos e envolventes em situações nada coerentes enquanto parte, mas bastante coesas como um todo, são formais demais. Marques e Mendonça não são pais tão liberais quanto parecem ser. Cada movimento, principalmente em Yheuriet Kalil e Luisa Herter, exibe uma marca que talvez devesse ficar submersa. Dos olhos a ponta do pé, de um modo geral, o espetáculo exibe uma insegurança própria de filhos cujas mães não são experientes ou são rígidas demais. Acrescenta-se a isso a triste situação do Teatro Hebraica, sucateado por sua mantenedora. Um palco com piso de parquet não favorece ninguém que não a tia da limpeza. O mesmo se dá na relação calças e iluminação. As calças de Kalil e de Rafael Régoli refletem a luz, essa já bastante pobre em termos técnicos, embora com visível boa vontade naquilo que diz respeito à estética.
Rafael Régoli mostra-se como um ator bastante interessante nesse primeiro semestre do ano. Com uma masculinidade visível tanto no rosto como nos movimentos corporais, seus exercícios cênicos, a guisa disso, têm sido lançados em outras direções. Em “Meu casamento com mamãe”, o ator diminui aquilo que lhe é natural, com vistas a equiparar-se com aqueles com quem contracena, exibindo uma maior flexibilidade, a sensibilidade que lhe é oposta ao que se vê. Uma vez que, em outra situação, a mesma postura garantiu ao trabalho um bom resultado, aqui infelizmente a fuga do natural encosta no artificial, mesmo não ficando nela.
O melhor de todos os elementos desse espetáculo bastante interessante é Vivian Salva: espontânea como, em teoria, o trabalho visa ser. Tudo o que uma mãe quer para seu filho não é mesmo vê-lo feliz? A atriz, em sua performance, dá balanço e leveza para a produção, tão carregada de combinações.
Para mim, o último suspiro é o da morte. Quando a filha se torna também mãe, deixando de ser filha, para entender a mãe e continuar a vida, mudando somente aquilo que sempre será. Agradece-se os anos de filiação e um novo nascimento se dá. No espectador, a história nasce assim que sai do corpo do palco cheio.
“Meu casamento com mamãe” me lembrou que minha mãe nunca me contou histórias porque eu mesmo sempre as inventei. E a dificuldade das pessoas compreenderem um espetáculo como esse reside unicamente na falta de entendimento de que quem ouve uma história também a escreve.
- Dona Francisca, um café, por favor?
*
FICHA TÉCNICA
Direção:
Eduardo Mendonça e Fernanda Marques
Direção:
Eduardo Mendonça e Fernanda Marques
Elenco:
Yheuriet Kalil,
Luisa Herter,
Vivian Salva,
Rafael Régoli,
Eduardo Steinmetz.
Roteiro: o Grupo
Trilha Sonora: Ian Ramil, Eduardo Mendonça e Leo Aprato
Figurinos: João Junior
Cenário: Gabriel Lagoas
Produção: Ambrosia Cultural e Nossa! Produtora
Apoio: Studio Stravaganza
1 Comentário:
Então foste ver e escreveu sobre? Sabes quem fez o figurino, não?
Espero que lembre.
Abração com saudades,
João.
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