Comédia dos Amantes
Terapia Conjugal no teatro porto-alegrense
Porto-alegrenses, no que diz respeito a teatro, é o povo que melhor se relaciona com seu cônjuge. Se não é, tem tudo para ser. Das 51 peças do Porto Verão Alegre, contei dezenove que se anunciam com temática nas relações. “A Comédia dos Amantes” é uma delas. Com direção de Oscar Simch, a produção, nesse lugar comum em que se encontra o tema, se destaca por não trazer a palavra de pseudo-psicólogos, que têm sempre algo a dizer sobre como deve ser um relacionamento, como uma mulher deve ser (bem) tratada ou como um homem deve ser conquistado, espezinhado ou abandonado. Flávio Bicca Rocha e Ana Guasque são diferentes porque trazem o que diz a dramaturgia mundial sobre isso. Talvez seja esse o motivo, pela riqueza da proposta, do Câmara ter estado bastante cheio no final de semana.
Desnudar. Tirar a roupa. Ficar íntimo: além da relação de amor entre homem e mulher, o teatro é visto do lado de dentro. O cenário nos faz sentir sentados dentro do palco, na coxia. Os painéis estão virados para o fundo, vemos o madeirame, os pregos, o espelho do camarim, a arara com os (ótimos) figurinos que serão usados. Os atores, ao contrário disso, não apresentam a história, ou as histórias, de costas para nós. A estranheza nos faz entender que trataremos da história da dramaturgia no trato com o tema relação amorosa (heterossexual). E quando pensamos que pára por aí, logo no primeiro quadro, o campo se afunila ainda mais: o tom será comédia.
Quanto à história do teatro, a cada novo quadro, entramos mais para dentro do tempo. Partindo do século XX, chegamos ao século IV antes de Cristo, do modernismo brasileiro de Nelson Rodrigues, à comédia grega clássica de Aristófanes, passando pelo vaudeville francês, o melodrama norte-americano, o texto shakespeariano. Na introdução, os atores informam alguns dados sobre os autores e as épocas e contextualizam os gêneros. “A Comédia dos Amantes” é sobre teatro.
Todas as cenas escolhidas e interpretadas de forma leve, comprometida com corpos disponíveis, energia e precisão de movimentos, são ou levam ao amor. Fala do amor de uma esposa por seu amante, da traição de um marido, da frivolidade de uma esposa, de barreiras sociais e assim por diante. Como diz Wim Wenders, história de morte só perde para história de amor. “A Comédia dos Amantes” é sobre amor.
Mas, como público, fiquei a pensar no que faltou para que essa produção com um elenco reconhecidamente talentoso e tecnicamente dedicado, um figurino, uma iluminação e um cenário tão bem produzidos e executados, e uma direção tão firme? Teria sido por causa da execução da trilha sonora com falhas compreensíveis (mas não aceitáveis)? Não... Sinto que o problema d “A Comédia dos Amantes”, e que faz com que ela não seja aplaudida de pé ao som de gritos de bravo e pedidos de bis, aparece justamente quando ela não é sobre comédia. E, às vezes, ela não é: como é o caso do primeiro quadro, que tanto diverge do último.
Se num, o riso é espontâneo, noutro, ele é pedido. Nelson Rodrigues não escreve comédia (há outros autores nacionais do século XX que se dedicaram a isso). Vaudeville só faz rir após a fixação do contexto dramático: o riso, nesse gênero, vem pela destruição da estrutura que foi recém construída. Numa pequena esquete, não há tempo suficiente para isso. Por outro lado, é um prazer imenso ver “Cata” e “Herô” sofrerem nas mãos de seus amantes, esses também personagens já criados para o riso, para o teatro, para a comédia e, como os porto-alegrenses (por que não?) para seus amantes.
Forçar comédia quando não há, o que felizmente acontece pouco nessa montagem tão bem-vinda entre tantas, é tão chato quanto forçar discussão de relacionamento nos palcos da capital gaúcha.
Porto-alegrenses, no que diz respeito a teatro, é o povo que melhor se relaciona com seu cônjuge. Se não é, tem tudo para ser. Das 51 peças do Porto Verão Alegre, contei dezenove que se anunciam com temática nas relações. “A Comédia dos Amantes” é uma delas. Com direção de Oscar Simch, a produção, nesse lugar comum em que se encontra o tema, se destaca por não trazer a palavra de pseudo-psicólogos, que têm sempre algo a dizer sobre como deve ser um relacionamento, como uma mulher deve ser (bem) tratada ou como um homem deve ser conquistado, espezinhado ou abandonado. Flávio Bicca Rocha e Ana Guasque são diferentes porque trazem o que diz a dramaturgia mundial sobre isso. Talvez seja esse o motivo, pela riqueza da proposta, do Câmara ter estado bastante cheio no final de semana.
Desnudar. Tirar a roupa. Ficar íntimo: além da relação de amor entre homem e mulher, o teatro é visto do lado de dentro. O cenário nos faz sentir sentados dentro do palco, na coxia. Os painéis estão virados para o fundo, vemos o madeirame, os pregos, o espelho do camarim, a arara com os (ótimos) figurinos que serão usados. Os atores, ao contrário disso, não apresentam a história, ou as histórias, de costas para nós. A estranheza nos faz entender que trataremos da história da dramaturgia no trato com o tema relação amorosa (heterossexual). E quando pensamos que pára por aí, logo no primeiro quadro, o campo se afunila ainda mais: o tom será comédia.
Quanto à história do teatro, a cada novo quadro, entramos mais para dentro do tempo. Partindo do século XX, chegamos ao século IV antes de Cristo, do modernismo brasileiro de Nelson Rodrigues, à comédia grega clássica de Aristófanes, passando pelo vaudeville francês, o melodrama norte-americano, o texto shakespeariano. Na introdução, os atores informam alguns dados sobre os autores e as épocas e contextualizam os gêneros. “A Comédia dos Amantes” é sobre teatro.
Todas as cenas escolhidas e interpretadas de forma leve, comprometida com corpos disponíveis, energia e precisão de movimentos, são ou levam ao amor. Fala do amor de uma esposa por seu amante, da traição de um marido, da frivolidade de uma esposa, de barreiras sociais e assim por diante. Como diz Wim Wenders, história de morte só perde para história de amor. “A Comédia dos Amantes” é sobre amor.
Mas, como público, fiquei a pensar no que faltou para que essa produção com um elenco reconhecidamente talentoso e tecnicamente dedicado, um figurino, uma iluminação e um cenário tão bem produzidos e executados, e uma direção tão firme? Teria sido por causa da execução da trilha sonora com falhas compreensíveis (mas não aceitáveis)? Não... Sinto que o problema d “A Comédia dos Amantes”, e que faz com que ela não seja aplaudida de pé ao som de gritos de bravo e pedidos de bis, aparece justamente quando ela não é sobre comédia. E, às vezes, ela não é: como é o caso do primeiro quadro, que tanto diverge do último.
Se num, o riso é espontâneo, noutro, ele é pedido. Nelson Rodrigues não escreve comédia (há outros autores nacionais do século XX que se dedicaram a isso). Vaudeville só faz rir após a fixação do contexto dramático: o riso, nesse gênero, vem pela destruição da estrutura que foi recém construída. Numa pequena esquete, não há tempo suficiente para isso. Por outro lado, é um prazer imenso ver “Cata” e “Herô” sofrerem nas mãos de seus amantes, esses também personagens já criados para o riso, para o teatro, para a comédia e, como os porto-alegrenses (por que não?) para seus amantes.
Forçar comédia quando não há, o que felizmente acontece pouco nessa montagem tão bem-vinda entre tantas, é tão chato quanto forçar discussão de relacionamento nos palcos da capital gaúcha.
ELENCO:
Flávio Bicca
Ana Guasque
FICHA TÉCNICA
Roteiro: Luiz Arthur Nunues
Direção: Oscar Simch
Assist. Direção: Zé Victor Castiel
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