Médico à força
Relatório Médico
O paciente se encontrava em estado bastante interessante quando chegou à nossa clínica. Os atores estavam bastante firmes no texto de Moliére, o cenário linda e inteligentemente pronto, os figurinos do melhor jeito possível, a luz afinada e o material de divulgação organizado e limpo. Mas, imaginem só, tudo era tal qual um comerciante que arranja um espaço e enche a loja, mas mantém as portas fechadas. O que seria isso, então? Um depósito apenas. Sem dar lucro, sem graça, escuro e poeirento. Essa era a triste situação em que se encontrava o paciente quando procurou ajuda “médica”. Um feroz lenhador havia lhe batido fortemente por três vezes com o cabo de um machado. O atendimento, como se esperava, foi de urgência.
Os produtos viraram mercadoria. O ensaio tornou-se apresentação. E, num acender de luzes, tudo fez sentido. O tratamento utilizado foi o recomendado pelos estudiosos no gênero farsa: a coisa acontece rapidamente, de forma simples, leve e eficaz. Rápido porque nos identificamos sem delongas com o contexto da história, com os personagens e, também, com as situações. Simples porque o conflito e a resolução dele não exigem quase nada do seu público. Eficaz porque fica a dica: não faça nenhum mal a sua mulher porque ela poderá se vingar de você (e não se cure nenhuma donzela que estiver, felizmente, fadada à mudez, porque ela falará até que tenhamos vontade de lhe fazer mal!). O paciente, adequadamente tratado por seu público, nós!, curou-se do mal que o atormentava: teatro só é teatro quando tem público.
O figurino deixou de ser uma roupa do melhor jeito possível e passou a, como, também, a luz e o cenário, ser um código da cena, um sistema cheio de significados (alguns se relacionam com o teatro por nos remeterem à época, ao lugar, às características dos personagens, etc), mas que não têm o poder de construir significado algum e, por isso, como bem lhes cabe, desaparece. Os atores, esses sim, além de serem significados (seus corpos, faces, máscaras), são, antes de tudo, significantes (energia, intenção, emoção provocadora e provocada) e aparecem como grandes contadores de uma história secular. E isso tudo só aconteceu porque lá estávamos nós, corpo médico, a atribuir a cada elemento este e aquele valor.
Marcelo Adams destaca-se dentre todos os demais atores não só pelo personagem protagonista, mas por protagonizar (ação essa que qualquer coadjuvante, como bem são exemplos Nilson Asp, Daniel Colin e Cláudia Lewis, poderia fazer) a naturalidade de olhos mais velozes que as marcas, de ação mais fruto de reação do que de burocratização cênica. Os demais, protegidos pelo gênero, pela qualidade da produção, pela mão firme e experiente da diretora Margarida Leoni Peixoto, que lhes apresenta como bons intérpretes, parecem, em alguns momentos mais, em outros menos, não esquecer do tempo em que a loja era depósito, de que ensaio não era apresentação, ou seja, quando o tratamento hospitalar, esse oferecido por nós, platéia real e presente, ainda não havia chegado. Porta aberta, poeira entra. O brilho do novo logo desaparecerá.
Recomenda-se, como posologia, mais vindas ao hospital. Esse, por sua vez, só o será quando médicos houver. Assim, cabe a nós, público, tornar-mo-nos médicos à força, mas não com pauladas e, sim, com aplausos sinceros aos pacientes da vez: Cia. Teatro ao Quadrado.
Os produtos viraram mercadoria. O ensaio tornou-se apresentação. E, num acender de luzes, tudo fez sentido. O tratamento utilizado foi o recomendado pelos estudiosos no gênero farsa: a coisa acontece rapidamente, de forma simples, leve e eficaz. Rápido porque nos identificamos sem delongas com o contexto da história, com os personagens e, também, com as situações. Simples porque o conflito e a resolução dele não exigem quase nada do seu público. Eficaz porque fica a dica: não faça nenhum mal a sua mulher porque ela poderá se vingar de você (e não se cure nenhuma donzela que estiver, felizmente, fadada à mudez, porque ela falará até que tenhamos vontade de lhe fazer mal!). O paciente, adequadamente tratado por seu público, nós!, curou-se do mal que o atormentava: teatro só é teatro quando tem público.
O figurino deixou de ser uma roupa do melhor jeito possível e passou a, como, também, a luz e o cenário, ser um código da cena, um sistema cheio de significados (alguns se relacionam com o teatro por nos remeterem à época, ao lugar, às características dos personagens, etc), mas que não têm o poder de construir significado algum e, por isso, como bem lhes cabe, desaparece. Os atores, esses sim, além de serem significados (seus corpos, faces, máscaras), são, antes de tudo, significantes (energia, intenção, emoção provocadora e provocada) e aparecem como grandes contadores de uma história secular. E isso tudo só aconteceu porque lá estávamos nós, corpo médico, a atribuir a cada elemento este e aquele valor.
Marcelo Adams destaca-se dentre todos os demais atores não só pelo personagem protagonista, mas por protagonizar (ação essa que qualquer coadjuvante, como bem são exemplos Nilson Asp, Daniel Colin e Cláudia Lewis, poderia fazer) a naturalidade de olhos mais velozes que as marcas, de ação mais fruto de reação do que de burocratização cênica. Os demais, protegidos pelo gênero, pela qualidade da produção, pela mão firme e experiente da diretora Margarida Leoni Peixoto, que lhes apresenta como bons intérpretes, parecem, em alguns momentos mais, em outros menos, não esquecer do tempo em que a loja era depósito, de que ensaio não era apresentação, ou seja, quando o tratamento hospitalar, esse oferecido por nós, platéia real e presente, ainda não havia chegado. Porta aberta, poeira entra. O brilho do novo logo desaparecerá.
Recomenda-se, como posologia, mais vindas ao hospital. Esse, por sua vez, só o será quando médicos houver. Assim, cabe a nós, público, tornar-mo-nos médicos à força, mas não com pauladas e, sim, com aplausos sinceros aos pacientes da vez: Cia. Teatro ao Quadrado.
ELENCO:
Marcelo Adams
Anna Fuão
Cláudia Lewis
Daniel Colin
Eduardo Steinmetz
Luísa Herter
Nilson Asp
Thales de Oliveira
FICHA TÉCNICA
Autor: Molière
Direção: Margarida Leoni Peixoto
Cenário: Elcio Rossini
Figurino: Rô Cortinhas
Iluminação: Fernando Ochôa
Produção: Cia. Teatro ao Quadrado
2 Comentários:
Sabia que tinha que publicar meu comentário antes de ler o que tu havias escrito. Não deu outra. Tirando um "Q" de literatura que um cara da letras não pode evitar (e que, talvez, ainda te leve para a vida de escritor e não de crítico), tu és sempre muito preciso. Entra nos detalhes. Faz comentários coerentes. Eu fico lá, na terra do "impressionismo". Mas, cada um no seu icosaédro!
Dei boas risadas.
e quase sem ar, me vem a certeza:
estamos sem críticos de arte em Porto Alegre.
quem sabe economia seja o ramo correto ser seguido. ou enfermagem...
já que os murros que das em ponta de faca, não trará benefícios a ti, tão pouco para a sociedade porto-alegrense que de longe passa por seus "comentários" pretensiosamente chamados de crítica. depois das risadas, agradeço pela tentativa totalmente vã, capciosa e errônea de orientar o público de teatro.
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