O que seria do vermelho se não fosse o azul
Foto: Roberto Oliveira
Há o que há
Há pessoas e pessoas.
Há quem sinta o cheiro de gordura entrar pela janela, vindo de dois andares abaixo. Há quem ouça a entrada da novela com a televisão desligada por causa do vizinho do prédio ao lado. Tem gente que prefere Miami a Machu Picchu, e lazanha a pizza. Tem gente que sempre acha o Wally. Que esquece do cantor, mas nunca da melodia. Que odeia chimarrão. Que fica horas sem ir ao banheiro. Tem gente que nunca esquece do meu nome e pessoas que gravam o meu rosto, mas me chamam de Ricardo. E aqueles que são fascinados por uma boa história, como eu.
“O que seria do vermelho se não fosse o azul”, nova produção do Depósito de Teatro, dura quase uma hora, mas só nos últimos vinte minutos sentimos que há uma história sendo contada. Até aí seis atores lamentam a ausência de um sétimo que faria o protagonista numa peça teatral que será ou não apresentada sem ele. Os seis se dividem em dois grupos e quarenta minutos são preenchidos com idas e vindas, piruetas e paradas, diálogos, imagens, músicas e silêncios sem que haja uma diegese que leve isso tudo para algum lugar.
Fiz comigo mesmo um desafio: quanto tempo isso vai durar na minha mente?
9 dias depois...
Lucas Sampaio era chamado de Lucas, Juliano Canal de Juliano, Elisa Heidrich de Elisa e, assim, Francine Kliemann, Luiza Pezzi e Fabiano Silveira. Os figurinos eram composições geométricas com variações das cores branco, preto, vermelho e azul. O cenário era limpo, mas com o uso, através de painel, das mesmas cores. Ficou na minha cabeça também várias canções e marcações limpas, direções bem claras, gestos precisos. Uma das pequenas incursões no campo da narrativa está um “teatro de bonecos” em que uma Bota, uma Vassoura e um Balde conversam num diálogo extremamente rico e interessante, apesar de eu não me lembrar exatamente que diálogo era esse.
Também há uma cena com um vendedor de fitas e outras com personagens bastantes diferentes uns dos outros numa tentativa dos seis atores-personagens construirem juntos uma peça que substitua a que haveria caso o sétimo ator-personagem não tivesse faltado. A mensagem primeira diz respeito ao valor do trabalho em equipe, à importância de abdicar de certas preferências pessoais para o bem comum, sem que haja prejuízo à individualidade.
Nos últimos minutos, os seis atores sem direção conseguem se unir e viabilizar para o seu público, nós, um espetáculo (dentro do espetáculo dirigido por Roberto Oliveira) em que há a busca da tão falada “cor de colorido”, um misto de várias cores que expressa a diversidade, tema já tão muitas vezes batido em dezenas de fábulas infantis.
Mas não posso dizer que ficou só isso após esses nove dias. Várias vezes, durante a peça, e não me esqueço disso, me peguei olhando um outro, um terceiro espetáculo: a assistência do público infantil presente no Teatro Renascença. Crianças de várias idades completamente dentro do que os atores propunham, vibrando com o que viam, batendo palmas, participando, fruindo. Com eles, a partir das exteriozações deles, nós adultos sabichões que achamos que entendemos as crianças e podemos dizer pra elas o que é legal e o que não é, éramos convidados a rir também, a curtir a ausência de uma motivação narrativa forte acompanhada do excesso de imagens e movimentos tão cativantes. Roberto Oliveira e seu elenco e equipe técnica, afinados, unânimes, não deixam uma única intenção fora do lugar, mesmo que esse lugar não seja um drama. Tudo é organizado, eficiente e, acho que as crianças daquele dia concordariam comigo, divertido.
O lugar do vermelho e do azul é, quem sabe, o próprio colorido e não o arco-íris. Esse sim precisa de início e de fim, de sol e de chuva e também de pote de ouro para oferecer quem o trilhou sempre. O colorido só precisa existir no olhar de quem vive, por exemplo, o teatro, seja de que idade você for.
Há cores e cores... Ainda bem!
Há quem sinta o cheiro de gordura entrar pela janela, vindo de dois andares abaixo. Há quem ouça a entrada da novela com a televisão desligada por causa do vizinho do prédio ao lado. Tem gente que prefere Miami a Machu Picchu, e lazanha a pizza. Tem gente que sempre acha o Wally. Que esquece do cantor, mas nunca da melodia. Que odeia chimarrão. Que fica horas sem ir ao banheiro. Tem gente que nunca esquece do meu nome e pessoas que gravam o meu rosto, mas me chamam de Ricardo. E aqueles que são fascinados por uma boa história, como eu.
“O que seria do vermelho se não fosse o azul”, nova produção do Depósito de Teatro, dura quase uma hora, mas só nos últimos vinte minutos sentimos que há uma história sendo contada. Até aí seis atores lamentam a ausência de um sétimo que faria o protagonista numa peça teatral que será ou não apresentada sem ele. Os seis se dividem em dois grupos e quarenta minutos são preenchidos com idas e vindas, piruetas e paradas, diálogos, imagens, músicas e silêncios sem que haja uma diegese que leve isso tudo para algum lugar.
Fiz comigo mesmo um desafio: quanto tempo isso vai durar na minha mente?
9 dias depois...
Lucas Sampaio era chamado de Lucas, Juliano Canal de Juliano, Elisa Heidrich de Elisa e, assim, Francine Kliemann, Luiza Pezzi e Fabiano Silveira. Os figurinos eram composições geométricas com variações das cores branco, preto, vermelho e azul. O cenário era limpo, mas com o uso, através de painel, das mesmas cores. Ficou na minha cabeça também várias canções e marcações limpas, direções bem claras, gestos precisos. Uma das pequenas incursões no campo da narrativa está um “teatro de bonecos” em que uma Bota, uma Vassoura e um Balde conversam num diálogo extremamente rico e interessante, apesar de eu não me lembrar exatamente que diálogo era esse.
Também há uma cena com um vendedor de fitas e outras com personagens bastantes diferentes uns dos outros numa tentativa dos seis atores-personagens construirem juntos uma peça que substitua a que haveria caso o sétimo ator-personagem não tivesse faltado. A mensagem primeira diz respeito ao valor do trabalho em equipe, à importância de abdicar de certas preferências pessoais para o bem comum, sem que haja prejuízo à individualidade.
Nos últimos minutos, os seis atores sem direção conseguem se unir e viabilizar para o seu público, nós, um espetáculo (dentro do espetáculo dirigido por Roberto Oliveira) em que há a busca da tão falada “cor de colorido”, um misto de várias cores que expressa a diversidade, tema já tão muitas vezes batido em dezenas de fábulas infantis.
Mas não posso dizer que ficou só isso após esses nove dias. Várias vezes, durante a peça, e não me esqueço disso, me peguei olhando um outro, um terceiro espetáculo: a assistência do público infantil presente no Teatro Renascença. Crianças de várias idades completamente dentro do que os atores propunham, vibrando com o que viam, batendo palmas, participando, fruindo. Com eles, a partir das exteriozações deles, nós adultos sabichões que achamos que entendemos as crianças e podemos dizer pra elas o que é legal e o que não é, éramos convidados a rir também, a curtir a ausência de uma motivação narrativa forte acompanhada do excesso de imagens e movimentos tão cativantes. Roberto Oliveira e seu elenco e equipe técnica, afinados, unânimes, não deixam uma única intenção fora do lugar, mesmo que esse lugar não seja um drama. Tudo é organizado, eficiente e, acho que as crianças daquele dia concordariam comigo, divertido.
O lugar do vermelho e do azul é, quem sabe, o próprio colorido e não o arco-íris. Esse sim precisa de início e de fim, de sol e de chuva e também de pote de ouro para oferecer quem o trilhou sempre. O colorido só precisa existir no olhar de quem vive, por exemplo, o teatro, seja de que idade você for.
Há cores e cores... Ainda bem!
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Elenco:
Elisa Heidrich
Fabiano Silveira
Francine Kliemann
Juliano Canal
Lucas Sampaio
Luiza Sperb
Ficha Técnica:
Cenário: Modesto Fortuna e Rudinei Morales
Figurinos: Ana Fuchs e Ig Borghese
Direção Musical: Roberto Chedid
Bonecos: Guilherme Luchsinger
Adereços: Francisco de los Santos
Músicas: Roberto Chedid
Letras: Roberto Oliveira
Projeto Gráfico Lucas Sampaio e Yheuriet Kalil
Divulgação: Luísa Barros
Produção: Depósito de Teatro
Texto e Direção: Roberto Oliveira
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