Andy / Edie (escrito em julho de 2006)*
/: a nova peça de João Ricardo
Uma vez escrevi para o João que ele era um cara cuja obra me fazia ter orgulho de ter 26 anos. E assistindo ao seu mais novo trabalho, "Andy/Edie", em cartaz no Teatro de Arena, ratifico o dito, acrescentando novas observações.
A sala toda pintada de branco, luzes de néon, filmadora em pleno funcionamento, tvs espalhadas pela platéia... É um abuso como ele consegue unir tantas linguagens diferentes num só espetáculo, num só fight. E consegue! Tal como alguém que nasceu com o controle remoto na mão, a turma do balão mágico, a redemocratização, a aids. Tal como um grupo de pessoas que aprenderam a transar com a volta da onda do sexo livre já morrendo por causa das campanhas de "use camisinha". Uma geração que viu o Papa morrer e ficou puto da vida com o carnaval todo que fizeram com o corpo do homem, tenha ele sido um cara bom ou ruim. Uma geração mais tetra e penta que todas as anteriores, mais de saco cheio com o empeachmment do tal presidente mais que todas, mais mtv que todas. Talvez pessoas mais pop art que todas porque vivemos num tempo que a Parada Gay de São Leopoldo traz 40 mil pessoas e, por outro lado, há uma rua em Novo Hamburgo que, numa contagem rápida, tem 9 igrejas de denominações diferentes. Acho que crescemos no meio do lixo de Andy Warhol, entre as latas de sopa e os retalhos de uma sociedade em ebulição há tanto tempo que já se tornou chato falar disso.
Andy Warhol e a pop art são os cenários de João Ricardo, mas não o seu o tema. O tema, já trazido em "Celebridade", tanto da Globo como de Wood Allen, é a mania humana de sonhar em deixar marcas para o futuro. Os homens da caverna e os homens da capela (sistina) já pensavam assim... Mas talvez os andaimes de Michelangelo não eram tão altos como os de Edie Sedwick e as pinturas nem tão "chão" como as Warhol. E é nessa mistureba de ontem e de hoje, de cima e debaixo, de Hollywood e de pilas pras festinhas que se encontra o trabalho de João Ricardo. O título da peça tem uma barra que separa os primeiros nomes dos protagonistas. Eu diria que o título, na verdade, só precisaria da barra, pois é na linha diagonal que divide e junta que encontramos a certeza de um excelente trabalho desse feliz jovem diretor.
Excepcional os tijolos dessa história... As cenas de Bob Dylan e Edie são os ganchos que nos lembram estar num palco vendo teatro. Todo o resto é navio que voa pelas imagens, pela comunicação, pelo intertexto. Somos um mouse entrando nos desejos de Gerard Malanga e na ascenção de Ingrid Superstar. Somos um clique que abre telas de Warhol, sem estarmos de frente para um catálogo de artes plásticas. "O que você tem feito?" * pergunta Edie. "Arte!" * responde Andy. É isso. Só isso. Tudo isso. Para o nosso bem, nós que precisamos de energias bem feitas e bem conduzidas (não confundir com energias boas, que demais, são tão ruins como as ruins), de histórias bem contadas, de desenhos traçados conscientemente a qualquer modo, como também de qualquer modo somos crescidos, nascidos e mortos.
Eba! para as interpretações de Sissi Venturin, Rodrigo Scalari e Lisandro Bellotto. Viva! para a surpresa que é Ravena Dutra. Valeu! pelos figurinos de Lucia Panitz, a luz maxi mega multipixel boa de Jô Fontana. Mas o blá blá blá geral mesmo é em torno de João Ricardo com aqueles rodopios todos com a câmeras, com os corpos, com os cigarros, com as perucas, com as músicas, com os vídeos, com o show todo que é Andy/Edie e, enfim, com os nossos sinceros aplausos.
* Ainda não consegui escrever sobre "Tereza e o Aquário".
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